
Splatoon aos 10 anos: Ainda fresco, ainda estranho
Splatoon tem oficialmente 10 anos e continua a ser o jogo de tiros online mais estranho que a Nintendo - ou alguém - alguma vez criou. Nascido num mundo pós-Call of Duty e, de alguma forma, feito para crianças, nunca se enquadrou em nenhum género tradicional. Não se tratava de mortes. Não se tratava de controlo de território no sentido habitual. Tratava-se de cor, caos, moda e vibrações. Dez anos depois, essa decisão de romper com a norma ainda parece revolucionária.
O que tornou Splatoon tão diferente foi o facto de não ter tirado a maioria das suas ideias de outros jogos. Em vez disso, olhou para o mundo real - o streetwear de Tóquio, a arte do graffiti, os ídolos de J-pop, os festivais de verão - e remisturou tudo em algo completamente seu. Isto não foi uma coincidência. A Nintendo não se propôs fazer um shooter para crianças. Queriam algo totalmente novo e começaram com 70 conceitos diferentes antes de chegarem a Splatoon.
"Queríamos criar um novo tipo de jogo, sem nos preocuparmos em tentar encaixar em géneros de jogos existentes." - Ex-CEO da Nintendo, Satoru Iwata
Esta citação faz parte de uma entrevista promocional, mas é válida. O que é impressionante nesse processo de design inicial é a pouca linguagem tradicional de jogos que aparece. Em vez disso, os criadores continuaram a colocar a si próprios questões básicas e intuitivas. Não "que mecânicas funcionam nos jogos de tiros?" mas "o que é que sabe bem jogar?" "O que é que faz sentido em termos visuais?" "O que seria divertido de usar?"
O primeiro protótipo funcional tinha jogadores a cobrir um campo de batalha com tinta. Mas as personagens não eram lulas. Eram blocos de tofu. Cubos simples, de rosto branco, que podiam desaparecer na tinta. Funcionais, mas completamente não comercializáveis. A equipa trocou brevemente para coelhos - mais fáceis de ler em movimento, com as suas orelhas compridas e silhuetas distintas - mas voltaram a bater numa parede: porque é que os coelhos disparam tinta?
Por fim, alguém disse: "As lulas atiram tinta". E tudo fez sentido.
Foi nessa altura que o design, a narrativa e a mecânica se alinharam finalmente. As lulas podiam nadar através da tinta. Isso significava travessia vertical. Significava ataques furtivos. Significava transformar um jogo de tiros numa corrida de pintura de território. Essa única decisão desbloqueou tudo o resto.
As armas em Splatoon não são armas no sentido tradicional. São pistolas de água, rolos de pintura, pincéis de tinta e baldes. O tipo de material que já viste num parque infantil ou numa aula de arte. Não há curva de aprendizagem se fores um miúdo de 10 anos a pegar nisto pela primeira vez. Apanha-se logo.
Essa brincadeira estendeu-se ao resto do jogo. Os mapas de Splatoon pareciam parques de skate e praças da cidade. O seu centro principal, Inkopolis, era uma mistura de distritos de moda de Tóquio e becos de Instagram. As suas mascotes - as Squid Sisters, Pearl e Marina, Deep Cut - inspiraram-se em ídolos do mundo real e na cultura de DJ, desde Hatsune Miku a duos de hip-hop.
Entrar no Splatoon não significava apenas aprender a jogar - significava descobrir toda uma vibração. A estética era importante. A moda era importante. Não porque aumentava as estatísticas (normalmente), mas porque dizia algo sobre ti. Nesse sentido, o Fortnite foi o melhor jogo de sempre.
A comparação é difícil de evitar. Ambos os jogos têm um design que privilegia o estilo, eventos sazonais rotativos e concertos no jogo. Mas o Fortnite quer ser tudo - um cinema, um local de concertos, uma máquina de venda de marcas. O Splatoon sempre foi mais pequeno. Mais apertado. Mais focado.
Cada entrada de Splatoon acaba por ter o seu "Splatfest final" - um último confronto antes do fim do suporte ao vivo. Não há actualizações intermináveis, nem crossovers de marcas, nem skins da Ariana Grande ou da Guerra das Estrelas. O jogo tem um início e um fim. A festa não dura para sempre.

Ainda assim, os eventos de Splatoon nunca foram apenas artifícios descartáveis. Os Splatfests pediam aos jogadores para escolherem lados - Ketchup vs. Mayo, Piratas vs. Ninjas - e depois lutarem pela glória do fim de semana. Eram em parte um clube de debate, em parte uma manifestação online e em parte uma ação de marketing. Eram tentativas óbvias de aumentar o envolvimento, mas também davam estrutura ao jogo. Um ritual.
"Quando estão no seu melhor, os Splatfests parecem festas de bairro." - GameSpot
A abordagem de Splatoon às redes sociais seguiu a mesma lógica. Inkopolis permite aos jogadores publicar mensagens desenhadas à mão que aparecem no jogo, retiradas de actualizações em tempo real. Sem algoritmo, sem curadoria, apenas pensamentos crus e arte estranha de estranhos. Como um feed sem scroll infinito.
Esse imediatismo da moda, dos eventos e da comunicação faz com que Splatoon pareça um instantâneo no tempo. O mundo não é apenas elegante. Parece vivido. Estas lulas-crianças usam roupas humanas antigas. Ouvem música que os humanos podem ter feito. Jogam jogos humanos num mundo pós-humano. Tudo é brilhante e otimista, mas a história subjacente é pós-apocalíptica. A Terra foi-se. As lulas tomaram o controlo.
Não é subtil. E não tenta ser.
Já não se pode jogar o Splatoon original. Os servidores estão em baixo. A Inkopolis de 2015 foi-se. Tinhas de lá estar. Dessa forma, Splatoon reflecte a sua própria história - uma cultura construída sobre os ossos de outra. Miúdos com casacos fixes, a dançar ao som de música que não compreendem bem, a atirar tinta como se isso significasse alguma coisa.
E para muitos de nós, significava.
Splatoon aos 10 anos não é sobre nostalgia. Trata-se de reconhecer como algo tão estranho, estiloso e ousado só poderia ter vindo da Nintendo em 2015. E como, apesar de tudo o que mudou nos jogos desde então, nada mais se parece com ele.
Comentários